Vamos recordar: Dark Chronicle

Em tempos que já lá vão e ainda quando os RPG estavam a conhecer o que podiam fazer dentro do género, Dark Chronicle da PS2, sucessor de Dark Cloud viveu a era dourada da consola e permanece uma das suas maiores jóias. Lançado no início dos anos 2000, o jogo, conhecido noutras paragens como Dark Cloud 2, chegou com a promessa de expandir a fórmula do seu antecessor, criando um universo de fantasia com uma direção artística singular e mecânicas que se diferenciavam do RPG tradicional, trocando combate por turnos por acção em tempo real.

Com a sua história de viagens no tempo, um vasto elenco de personagens e uma jogabilidade que misturava a exploração de masmorras com a reconstrução de mundos, Dark Chronicle era uma proposta ambiciosa. A sua importância para a época não reside apenas na sua qualidade, mas na forma como conseguiu oferecer uma experiência rica e gratificante num género que, por vezes, era dominado por fórmulas mais rígidas. Deu também a confirmação ao mundo de que a Level-5 tinha o que era preciso para ser uma companhia com espaço para ganhar nome.

A narrativa de Dark Chronicle é uma das suas primeiras grandes distinções. A história segue a jornada de Max, um jovem inventor, e Monica, uma princesa que viaja no tempo, na sua busca para impedir o Imperador Griffon de destruir o passado e o futuro. A premissa de viagem no tempo é utilizada de forma bastante positiva, fazendo com que a aventura se desenrole por diferentes épocas e cenários, desde cidades medievais a paisagens desérticas e aldeias futuristas. Os personagens secundários são carismáticos e bem desenvolvidos, e a relação entre Max e Monica, que trabalham em conjunto para desvendar todo o mistério em redor da história, dá um ritmo constante à aventura. Quem o jogou, irá certamente recordar-se que a história era levada com um tom leve e com muito humor, algo que a distinguia das narrativas mais sérias e complexas que eram comuns nos RPGs da época. A sua atmosfera convidativa e a forma como cada novo capítulo revelava um mundo totalmente diferente, eram elementos que nos mantinham presos ao jogo.

O grande triunfo de Dark Chronicle residia, sem dúvida, na sua jogabilidade e na forma como as suas mecânicas se interligavam. O jogo combinava a exploração de masmorras geradas num plano procedural, onde se lutava contra monstros e se recolhiam materiais, para incluir no sistema Georama. Este sistema permitia a utilizarem os materiais recolhidos para reconstruírem as cidades e os ambientes que tinham sido destruídos na história, o que por sua vez alterava o futuro. Era uma mecânica que dava um propósito significativo a cada sessão de dungeon-crawling, transformando uma tarefa repetitiva num processo criativo e recompensador.

Além disso, o jogo oferecia um sistema de síntese de armas supreendentemente detalhado, onde cada arma podia ser evoluída de várias formas. A mecânica de tirar fotografias a objetos e criaturas e combiná-las para inventar novas ferramentas era uma adição bastante inesperada que incentivava a exploração do mundo. A possibilidade de usar diferentes meios de transporte, como o ridepod de Max ou a forma de criatura mágica de Monica, adicionava uma variedade à jogabilidade que era incomum para a época.

Visualmente, Dark Chronicle foi um dos primeiros jogos a abraçar a estética cel-shaded na PS2, o que lhe deu um visual intemporal que envelheceu muito melhor que outros tantos da época. As cores vibrantes, os modelos de personagens expressivos e o estilo de arte semelhante a um anime deram ao jogo uma identidade visual forte, o que o ajudou a destacar-se dos outros títulos que tentavam o fotorrealismo nesta era e que envelheceram de formas pouco graciosas. Esta escolha de design não só lhe deu uma aparência distinta como também contribuiu para a sua longevidade, pois o visual continua a ser tão cativante hoje como era há vinte anos.

Claro que não podia deixar de falar da banda sonora, que até teve direito a um dos nossos PróximoNível Jukebox há alguns anos atrás e foi uma das bandas sonoras que mandei vir do Japão de propósito. Estamos a falar de uma das melhores bandas sonoras da geração, com músicas memoráveis que vale a pena ouvir até mesmo fora do jogo.

O seu legado, embora talvez não tão massivo como o de outros RPGs da época, é o de um jogo que tentou ser diferente e que recompensou a curiosidade e a dedicação do jogador. Dark Chronicle foi importante para a sua época por ter provado que o género de RPG podia inovar de forma criativa, criando uma experiência que misturava a aventura com a construção e a exploração com a criação. É um título que, para muitos, tal como eu, permanece uma memória ligada incondicionalmente à era da PS2, um testamento à visão de uma equipa que não teve medo de arriscar e criar algo verdadeiramente especial.

Apesar de nunca ter tido direito a um remake ou remaster a sério, conseguem jogá-lo na PS4 e PS5 através do PS Plus Premium ou comprando na PS Store.

Daniel Silvestre
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