Análise: RPG – Real Playing Game

O que acontece quando TronThe Hunger GamesO CuboInceptionCasa dos Segredos, um fascículo muito antigo do The Punisher (Marvel) e Luís Vaz de Camões fazem bebés? Algo parecido com RPG – Real Playing Game.

RPG é a nova aposta do cinema português, produzido pela MGM Filmes, que pisca o olho ao mercado internacional. A película está gravada em inglês e o enredo apela a vários lugares comuns da tendência recente do cinema actual. Será uma decisão censurável? Claro que não. Na arte o importante é a mensagem, e neste particular, RPG desempenha um óptimo trabelho. Além do mais, se um filme de genética nacional atingir um mercado maior, consegue fazer mais pelo cinema português do que um filme que encolhe-se nas próprias fronteiras.

RPG narra uma realidade futurista, na qual, uma tecnologia em desenvolvimento permite completar um dos maiores desejos da humanidade, a juventude eterna. Através de uma operação tecnológica, qualquer indivíduo pode completar esse desejo. Contudo há um senão. Para conquistar a juventude eterna é necessário sobreviver num jogo especial. Os candidatos são ligados neurologicamente a um sistema, que remete vários jogadores para um terreno de jogo. A lógica premeia o único sobrevivente, com a ambicionada juventude eterna, implicando que os jogadores eliminem a concorrência.

O elenco de RPG conta com um naipe interessante de actores, à cabeça: Rutger Hauer, o actor que desempenhou Roy em Blade Runner. O restante elenco é composto por outros actores internacionais, com destaque para as interpretações de Alix Wilton ReganDafne Fernández, Genevieve Capovilla e Nik Xhelilaj. Também há actores portugueses a ter em conta, como Soraia Chaves, Pedro Granger e Débora Monteiro. Nunca é “pera doce” dirigir actores de diferentes nacionalidades (The Wolverine é um bom exemplo), e RPG fica aquém no departamento da representação, órfão de interpretações solidas e personagens carismáticos. Chris Tashima (interpreta GameKeeper), consegue evidenciar-se e cativa a vontade de querer saber mais sobre o passado, o presente e o futuro do personagem.

A realização, dividida por David Rebordão e Tino Navarro, está boa, dando a entender que em Portugal há qualidade por detrás das objectivas. Evidentemente que não há orçamento para grandes experiências artísticas, mas quando puxam as fronteiras em RPG, resultam sempre bem. A edição em RPG tem bandeira azul, revelando-se uma ferramenta importante para o encadeamento dos planos.

Nos outros aspectos técnicos, há a salientar uma banda-sonora que trabalha em prol da temática do filme e um trabalho de produção consciente da perspectiva de baixo-orçamento. O ambiente futurista é fascinante e acaba por saber a pouco (mérito para o detalhe do guarda-roupa de acordo com a temática) enquanto a acção principal decorre num único cenário, funcionando de acordo com o enredo (Reservoir Dogs foi filmado num armazém e é uma obra-prima).

Mas nem tudo são rosas em RPG, o primeiro acto é curto – esta sensação não se deve apenas pela vontade de ver mais do universo futurista e pela presença de Rutger Hauer – para estabelecer uma relação emocional com o personagem principal e a realidade onde se insere. Para amenizar o impacto dos primeiros minutos, a exposição é verbalizada e a acção precipita-se para o segundo acto.

Há igualmente algumas perguntas a colocar em relação à verosimilhança da mecânica do jogo, contudo, essas perguntas devem (deveriam) ficar em segundo plano, tendo em conta que os personagens terão de lidar com a necessidade primordial da sobrevivência. Infelizmente, os personagens estão subdesenvolvidos e não são carismáticos, sendo impossível estabelecer relações de empatia/antipatia quando estão em perigo ou em situações de limite. Felizmente, o mistério e as dinâmicas entre personagens funcionam em crescendo, e o herói desempenha na perfeição o arco do personagem, alcançando a derradeira e fundamental epifania.

RPG rompe com alguns preconceitos e abre algumas janelas para que se possa respirar melhor no cinema português. Apesar de algumas insuficiências (acredito que não existiriam se o orçamento tivesse mais alguns zeros no cheque), o filme merece destaque no marasmo do cinema nacional.

RPG incute algumas reflexões filosóficas consistentes e a mensagem final é transversal a culturas e épocas. Evidentemente que ainda suspiramos pelo nosso Cidade de Deus, mas esse dia fica mais perto com produções como RPG.

 

Positivo

  • Rutger Hauer! É para deixar qualquer fanboy em polvorosa
  • Apesar das ideias recicladas, RPG é sólido e cativante
  • Ambiente futurista
  • Boas ideias não implicam grandes investimentos
  • Epílogo

 

Negativo

  • Os actores portugueses de elite não conseguem ombrear com actores estrangeirões desconhecidos
  • Personagens subdesenvolvidos
  • Exposição verbalizada
  • Spoiler Alert: No topo da tabela de prioridades do ser-humano está a sobrevivência, só depois, muito depois, surge a necessidade de fazer sexo

Share

You may also like...

error

Sigam-nos para todas as novidades!

YouTube
Instagram