Análise – Final Fantasy XVI

Final Fantasy é uma das sagas mais emblemáticas dos videojogos e é sinónimo de um feito na indústria. Entre gerações, o lançamento de um novo jogo ditava um novo passo em gráficos, história e nos elementos que representavam o que é ser um bom RPG. Isto foi quase sempre verdade e mesmo que jogos como Final Fantasy XII ou Final Fantasy XIV tenham mudado o paradigma, continuavam a ser referências do género e bons jogos por mérito próprio.

Final Fantasy XVI também segue o mesmo caminho de tentar criar uma nova referência dentro do mundo dos videojogos. Porém, apesar de ser um jogo de qualidade, vai bem além dos limites impostos pela franquia ao longo dos tempos, transformando-se de num bom jogo, mas deixando se ser um bom Final Fantasy.

Existem várias transformações que a série sofreu ao longo dos anos, mas Final Fantasy XVI é sem dúvida o mais distante que se colocou em relação aos antigos jogos da saga. Para começar, a história parece ter sido claramente inspirada num mistura entre as séries de The Game of Thrones e The Witcher, havendo até um ambiente muito similar constantemente presente no jogo. É verdade que Final Fantasy nunca teve um ambiente totalmente medieval, mas nunca deixou de ter o seu estilo típico japonês de um JRPG, o que o coloca bem longe dos ambientes mais leves ou descontraídos da maioria dos jogos anteriores.

Depois temos o enredo, que é dos mais negros, cheio de personagens detestáveis e opressivos de toda a saga. Clive é o herói principal e ainda consegue ser mais sofrido que Cloud. Em seu redor há morte, conspirações negras, violência gratuita e um rol de personagens que só pensam em coisas maquiavélicas. Claro que existem (felizmente), algumas personagens que tentam aligeirar o ambiente, como é o caso de Cid, Torgal (um cão lobo) ou até de Jill, mas a maior parte do tempo, temos um jogo que foi feito para ser negro e com cheiro a destino sombrio. Com todas estas personagens e trama, a introdução do Active Time Lore foi muito bem-vinda. Esta é uma ferramenta que podemos aceder durante as cinemáticas que nos dá mais informação sobre localizações ou personagens que estão a ser mencionadas. Dá bastante jeito, especialmente para quem faz grandes pausas entre sessões de jogo.

A forma como a história está concebida faz com que Final Fantasy XVI pareça muitas vezes que está a decorrer em corredores. Embora existam umas zonas mais abertas à exploração, grande parte do que o jogo tem para oferecer faz com que seja necessário ir de ponto A a ponto B, ver uma cinemática, lutar contra alguém e repetir o sistema constantemente. Grande parte das secções, especialmente nas primeiras horas são muito lineares e o que está lá “a mais”, está lá apenas para dar um pouco de movimento a áreas que se sentem muitas vezes praticamente vazias. Claro que existem cenários bonitos e paisagens impressionantes, mas isso já é um pré-requisito de um Final Fantasy.

Grande parte da história faz com que sejam constantemente empurrados para o tema central do jogo, a luta entre Dominants e a guerra para os utilizar. Como os Dominants têm super poderes e conseguem invocar criaturas (summons), grande parte destes momentos acabam por levar a combates contra estes inimigos que duram um bom bocado, não só porque são criados prepositadamente para serem épicos, mas porque os inimigos são umas verdadeiras esponjas de dano que estão feitos e pensados para terem ataques com padrões que tramam pessoas como eu que são péssimos com timmings. De qualquer forma, estes combates são empolgantes e à medida que os Summons aparecem, existem combates de titãs que são visualmente impressionantes, mas quase sempre um pouco automáticos.

O combate é outro ponto onde Final Fantasy XVI deixa para trás as suas origens e se foca em ser praticamente um Devil May Cry. Desde Final Fantasy XII que os combates por turnos são cada vez mais uma coisa do passado e aqui o conceito é verdadeiramente obliterado. Clive é a única personagem que controlamos em combate (podemos dar indicações a Torgal no máximo) e tudo é feito em tempo real, desde o atacar até ao desviar, usar magias ou items. O combate é rápido (embora os inimigos sejam esponjas) e a ideia é combinar ataques e usar habilidades para conseguir partir a barra de resistência do inimigo, o que o coloca num estado de paralisia, onde podemos dar dano com menor perigo. É positivo que tenham sido criadas várias habilidades que nos permitem aproximar dos inimigos ou até puxá-los na nossa direcção, o que faz com que seja tudo muito mais interligado. Apesar dos combates contra bosses serem muito mais complicados, quando encontramos inimigos mais básicos, estes parecem sacos de pancada que pouco fazem para ser uma ameaça. Curiosamente, o jogo consegue ficar mais divertido se puserem em modo história, já que um inimigo sofre mais dano e em vez de perder 5 minutos a bater em algo repetidamente, temos o mesmo efeito em 2 minutos, o que para mim é uma vantagem bem-vinda.

O último ponto em que Final Fantasy XVI difere bastante dos anteriores e desta vez, de todos os RPG é o facto de ser pouco RPG em termos de progressão de personagem. Sim, Clive sobe de nível para ganhar mais poder e podemos equipar armas diferentes e ganhar habilidades, mas é praticamente por aqui que se fica, não sendo muito distante de jogos como God of War ou Spider-Man que podem afirmar ser tão RPG como ele dadas as suas semelhanças em evolução. De certa forma, é quase como se a Square-Enix tivesse afastado aquilo que poderia ser “aborrecido” para apelar a uma nova geração.

Quanto a conteúdo extra, Final Fantasy XVI é relativamente uma ideia muito focada no seu core. Existem um rol de missões secundárias para fazer em várias localizações que são muito próximas da genética de um MMO (não fosse esta equipa a mesma de Final Fantasy XIV Online), onde temos de encontrar X coisas, matar X bichos, escoltar algo, etc. A vasta maioria destas missões são demasiado básicas e sem grande sumo, o que é uma pena. Apenas um punhado delas são verdadeiramente interessantes e dão mais profundidade ao mundo de jogo. Além disto não existe muito mais para fazer, nada de mini-jogos com cartas ou peças ou seja o que for e a longevidade passa por fazer o jogo em New Game Plus. Tendo em conta que a história dura cerca de 30 horas, no geral podem contar com cerca de 60 horas com tudo feito.

Em termos visuais, Final Fantasy XVI é um jogo que engana bem. Debaixo de um motor de jogo poderoso e com muito detalhe, está também um jogo que parece insistir em ser bastante cinzento e castanho. Mesmo quando viajam para zonas mais verdejantes, por algum motivo parece que a existe uma ligeira neblina na imagem que faz com que tudo pareça menos claro ou detalhado. Depois temos as personagens. A vasta maioria do que não são personagens principais, parecem NPCs glorificados de Final Fantasy XIV, aliás, até existem posturas e movimentos nos diálogos que fazem lembrar mesmo o MMO. Do outro lado da moeda temos combates recheados de efeitos de luz, particulas e animações que são muito impressionantes, onde o jogo já parece realmente de nova geração. É estranho ver esta dictomia de um jogo com grande investimento e feito como exclusivo ter pontos tão altos e depois ter diálogos tão lentos que fazem lembrar alguns diálogos mais embaraçosos da era das 128 bits.

A nível sonoro não há muito a dizer. As vozes em inglês estão espetaculares e os actores fazem um grande trabalho para passar a mensagem com maior credibilidade possível (talvez a voz de Joshua seja das piores que ouvi no jogo), havendo destaque para personagens como Clive, Cid e Gav, entre outros mais à frente que também estão muito bons. Depois temos a banda sonora que é bastante sólida no geral, mas incrivelmente poderosa nos combates, criando uma boa dose de adrenalina e de inspiração enquanto lutamos contra bosses ou batemos em Summons ao bom estilo de um Godzilla.

Apesar de todas as críticas eu fiz o meu melhor para tentar gostar de Final Fanatsy, mesmo que este tenha feito quase tudo para que eu o quissesse largar a meio das minhas horas de análise. No fundo, é um jogo que cresce connosco e que conseguimos obter algum prazer a partir da segunda metade, mas durante as primeiras 10 horas, senti que estava a jogar mais por ter de fazer a análise do que por o estar a apreciar e isto por estar a dar uma verdadeira chance contra o próprio fanboy de Final Fantasy à moda antiga que sou. Porém, o facto de ter um tema tão mais deprimente de forma constante, o facto das personagens demorarem a ficar interessantes, os combates serem longos e até repetitivos e os diálogos com animações e timming que já foram feitos em jogos que o inspiraram, mostram que este jogo tinha muito por onde melhorar.

Tirando os óculos do fanboy e vendo Final Fantasy XVI como um todo, consigo ver as suas qualidades e aquilo que quer fazer. Temos aqui um belo jogo de acção com um bom conteúdo cinemático e um enredo adulto que quer apelar a novas audiências. Por isso mesmo, Final Fantasy XVI é um grande com muita qualidade, embora não seja um grande Final Fantasy.

Positivo:

  • Visual tem momentos incríveis
  • Active Time Lore é uma boa ideia
  • Combate acaba por ficar bom
  • Alguns personagens bem conseguidos
  • Excelente trabalho sonoro
  • Torgal

Negativo:

  • Inimigos esponja
  • Poucos sistemas verdadeiramente JRPG
  • Animações bastante primitivas nos diálogos
  • NPC parecem importados de FF XIV
  • Doses demasiado grandes de dramatismo

 

Daniel Silvestre
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