Poucas são as produções de ficção científica que conseguem manter o balanço correcto entre a vertente humana e a vertente tecnológica e futurística, sem grandes exageros. Bem, este ano chega-nos Tales From The Loop para quebrar este estigma. A série é baseada num conjunto amplo de desenhos, feitos por um artista holandês, o qual pretendia misturar um cenário aparentemente natural, com um elemento tecnológico. Tais desenhos inspiraram a criação de um RPG de mesa de mesmo nome, e anos mais tarde, chegaram às mãos da Amazon Prime, que decidiu criar uma série, aquela que aqui irei analisar.
Tales From The Loop é uma série antológica, ao estilo Black Mirror, na qual cada episódio conta uma história diferente, mas que se ambienta no mesmo universo. Neste aspecto, Tales From The Loop consegue não se desviar muito entre cada narrativa, pois cada episódio é focado numa personagem diferente, que já apareceu noutro episódio anterior. Ou seja, é uma história interconectada, mas que não precisamos necessariamente de ver os episódios por ordem ou sequer vê-los a todos. Contudo, para que no último episódio tudo faça sentido, é recomendável ver toda a série. Neste sentido, o próprio nome da série é auto-explicativo, Tales From The Loop, relata vários contos que se passam no The Loop, isto é, um centro de investigação que está sediada, na cidade onde se passa toda a acção.
Como referi, cada episódio retrata uma situação diferente dos outros. Mesmo assim há determinados elementos comuns que cobrem toda a estrutura narrativa de cada episódio singular. A série é ambientada nos anos 80, ainda assim devido à presença de The Loop, esta é rodeada de tecnologias e invenções um tanto distantes daquelas que encontraríamos nesta época. Cada episódio, apresenta um novo conceito associado a uma invenção, que está também ela directamente ligada a uma personagem específica. Por exemplo, num dos episódios, Jakob (Daniel Zolghadri) e Danny (Tyler Barnhardt), dois amigos de infância, descobrem uma máquina no meio de uma floresta, que lhes permite trocar de corpos.
A série acompanha mais de perto, a família de Russ (Jonathan Pryce), o criador de The Loop, que a cria com o intuito de descobrir os maiores mistérios do universo, que aparentemente seriam impossíveis de desvendar. Todavia, a série nunca deixa explícito quais são os tais mistérios, e mesmo quando apresenta suavemente um, este nunca tem uma resposta. Portanto, fica tudo muito em aberto para possíveis interpretações do espectador, o que é uma coisa muito boa. Pois o guião dá-nos todas as ferramentas, simplesmente não nos dá as soluções, teremos de ser nós a pegar nas peças e montá-las para que faça sentido.
Ainda na família de Russ, é nos também apresentado George (Paul Schneider), o qual possuí um braço robótico misterioso, Loretta (Rebecca Hall), filha de Russ, a qual trabalha no The Loop como cientista física. Outros episódios focam, e muito, nos seus filhos como é o caso de Jakob e Cole (Duncan Joiner), tendo este último uma ligação muito próxima com o seu avô. Há também outras personagens que também têm o seu devido espaço para brilhar na série, como é o caso de Gaddis (Ato Essandoh), segurança no The Loop, e de May (Nicole Law), namorada de Jakob, entre outros.
Ainda assim, nem todos os oito episódios têm o mesmo nível de qualidade entre si. Há certas histórias que se destacam mais, como é o caso do episódio de May, no qual descobre um dispositivo que lhe permite parar o tempo, e onde acaba por aproveitar para ter um caso romântico com outra personagem. Por outro lado, há episódios que são aceitáveis, mas que devido ao seu pace e temática, acabam por ficar a desejar, como é o caso do episódio de Gaddis, no qual este descobre um aparelho que lhe permite viajar para uma dimensão, idêntica à sua, mas que é moldada por base nos seus desejos mais profundos.
Por falar em temáticas, este é um dos pontos fortes da série, pois como já referi, de que cada episódio conta uma perspectiva diferente, estes acabam também por abordar uma temática também ela diferente. Sob uma mística filosófica, há momentos em que nos vão fazer reflectir sobre o sentido da vida, sobre a idealização da perfeição e do amor, ou até mesmo sobre as implicações de viajar no tempo. Como o género da história recaí sobre a ficção científica, esta acaba por ter um grande papel na forma como nos é apresentada cada situação, e na medida em que cada dispositivo ou invenção que vemos em cada episódio, influência a natureza do homem e da sua existência.
Portanto, Tales From The Loop é daquelas séries, que nos vai fazer pensar e reflectir um pouco, antes de avançarmos para o próximo episódio, e talvez quem sabe, nos fazer ponderar sobre até que ponto aquelas situações apresentadas se refletem na nossa própria vida.
Em termos de estética e apresentação, este é igualmente um factor bastante positivo. Cada nova invenção ou aparelho apresentado, encaixa-se bastante bem na temática de ficção científica, e também na naturalidade do quotidiano das personagens. Daí ter referido no início da análise, que a série joga bem no balanço que faz entre a parte humana e emocional e a parte tecnológica e artificial, tanto nas temáticas, como nos próprios cenários. Neste requisito, é também bem sucedida em adaptar os tais desenhos do autor holandês, para o formato televisivo. É de ressalvar o cuidado e qualidade que a Amazon Prime deu, a este pormenor.
Quanto à banda sonora, esta não tem faixas propriamente memoráveis, mas todas se inserem correctamente no ambiente e na história. Isto deve-se muito, porque as próprias faixas são tratadas num tom harmonioso, as quais acabam por ficar silenciadas muitas vezes, pelo escopo da narrativa. Sem se destacar algum protagonismo para si.
De uma forma ou de outra, a meu ver, diria que é impossível quem vê, Tales From The Loop, ficar indiferente ou apático aos temas e mensagens que a série pretende transmitir. Mesmo tendo várias possíveis interpretações, a essência está lá bem visível. Todos os elementos da série contribuem e muito bem neste sentido. E apesar de nem todos os episódios terem a mesma qualidade entre si, Tales From The Loop cumpre a sua missão de entregar uma obra de ficção científica, que se destaca e afasta, no bom sentido, de produções do mesmo género, para entregar uma verdadeira experiência única.
Positivo:
- Temáticas filosóficas e refletivas;
- Mensagens bem-intencionadas que quer transmitir;
- Ambientação e cenários;
- Prestação de alguns membros do elenco;
- Efeitos especiais adequados;
- Criatividade e inovação para o género de ficção científica;
Negativo:
- A qualidade dos episódios não se mantém ao longo da série;
- Banda sonora não se destaca;