Análise – Mother! (por Rui Santos)

Mother!, o novo filme de Darren Aronofsky (Black Swan, The Fountain, The Wrestler), é certamente a sua longa-metragem mais surrealista e menos acessível. É um thriller psicológico ambicioso e, pelo menos à partida, bastante interessante, com uma narrativa ambígua que parece por vezes funcionar como um sonho (ou pesadelo) confuso e pouco imediato, uma lógica diferente da do mundo real.

A história centra-se em duas personagens sem nome, interpretadas por Jennifer Lawrence e Javier Bardem. Estas formam um casal que vive sozinho numa casa isolada da sociedade à qual vão chegando outras personagens ao longo do filme. A sua presença vai originando vários conflitos.

A narrativa é uma alegoria que explora diversos temas, como a religião, a natureza e a reação que a humanidade tem a estes assuntos. Não vou revelar a minha interpretação sobre o filme, mas acho que é fácil perceber o que este transmite de um modo geral, especialmente se interpretarmos a nomeação dada às personagens nos créditos.

Esta clareza acaba por ser uma fraqueza do filme, que ficaria a ganhar com mais algum mistério, surpresas ou desenvolvimento da narrativa. Senti falta de uma maior aposta no seu aspeto surrealista, especialmente pela curiosidade que as cenas iniciais, mais misteriosas do que tudo ou quase tudo o que se sucede, despertaram em mim.

Aronofsky já trabalhou de maneira mais complexa outros temas, mas em Mother! insiste sempre nas mesmas ideias, o que cria uma sensação de repetição que certamente poderia ser evitada, nem que fosse com uma menor duração. O filme pode ser uma montanha russa, mas uma que avança sempre na mesma direção.

O elenco não desaponta. Fiquei especialmente agradado com as atuações de Javier Bardem e Michelle Pfeiffer, mas Jennifer Lawrence também faz um bom trabalho num papel bastante diferente aos que costuma interpretar. Algumas das outras personagens são interpretadas por Ed Harris, Kristen Wiig e os irmãos Domhnall e Brian Gleeson.

A personagem de Jennifer Lawrence é a que mais tempo acompanhamos ao longo do filme enquanto este vai ficando cada vez mais tenso e frenético, especialmente durante a sua segunda metade. O cinematógrafo Matthew Libatique filma Lawrence de perto e capta grande parte da ação pelo ponto de vista da sua personagem, criando em partes uma sensação de claustrofobia e permitindo-nos sentir de maneira eficaz o crescendo de intensidade e confusão que a rodeia.

O trabalho de som também resulta bem e é um dos melhores e mais criativos elementos de Mother!. A banda sonora que Jóhann Jóhannsson compôs para o filme acabou por não ser utilizada. Em vez disso, recorreu-se a algo mais minimalista e o seu trabalho foi misturado com o de Craig Henighan, designer de som. Em vez de se ouvir música, nota-se um grande foco em ruídos da casa na qual tudo acontece: portas a abrir e fechar, objetos a cair, madeira a ranger. Isto está tão bem feito, evidenciado e detalhado que a própria casa pode ser vista quase como uma personagem, especialmente pela sua ligação à protagonista.

Infelizmente, estes aspetos mais bem conseguidos não conseguem compensar completamente os pontos fracos do filme. A execução é, no geral, eficaz, mas a base é insuficiente. O guião não consegue segurar o filme e este acabou por me desapontar. No entanto, goste-se ou não, não há como negar que Mother! é um filme diferente do habitual, o que leva compreensivelmente a uma receção divisiva. Se estão curiosos é possível que valha a pena verem, mas acho que o melhor é fazerem-no com expetativas moderadas. Na minha opinião, está longe dos melhores trabalhos de Aronofsky.

 

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