Análise – Junketsu no Maria (por Ana Beatriz Varela)

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_01_pn

NOTA: Este artigo foi escrito por um membro da comunidade do PróximoNível. Se quiserem ter um artigo de opinião, análise ou outro género de artigo destacado no site, podem enviar o mesmo para um dos membros da equipa do site. Depois de aprovação final, este é publicado sobre alçada de um dos editores, mas devidamente identificado, dando créditos ao escritor do mesmo.

Idade Média, magia, guerra, atos divinos e… uma bruxa virgem?

Junketsu no Maria, ou Maria the Virgin Witch, estreou em 2015 como anime, mas nunca é tarde demais para (re)ver esta obra de Ishikawa Masayuki. Adaptada para ecrã pelos (grandes) estúdios da Production I.G (Shingeki no Kyojin, Kuroko no Basket, Psycho-Pass, Ghost in the Shell, Prince of Tennis, entre tantos outros), é-nos contada a história de Maria, uma bruxa que vive em França durante a Guerra dos Cem Anos.

Neste contexto, as bruxas são vistas de duas maneiras: ou são hereges, maléficas, sujas e corruptas, ou são aliadas da medicina por conseguirem preparar medicamentos milagrosos. No caso de Maria, apenas quer ser justa e respeitada. Detesta guerras e tem como objetivo pessoal travar todos e quaisquer confrontos de que tenha conhecimento.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_02_pn

Temos uma França resiliente e uma Inglaterra invasora que combatem em solo francês, sob o olhar atento de Maria. De forma a interromper a guerra para que não haja mortes desnecessárias, a inocente bruxa invoca monstros e criaturas horríveis que assustam e afugentam os combatentes de ambos os lados. Este tipo de atitude acaba por chamar a atenção do Arcanjo Michael, que, descendo dos céus e demonstrando o seu desagrado, explica que não cabe a uma mera bruxa decidir o futuro dos comuns mortais, mas sim a Deus.

Não satisfeita, Maria recusa-se a deixar de interferir nas guerras dos humanos, não entendendo o porquê de os mortais rezarem constantemente por salvação, e os céus não a concederem. Implacável, o Arcanjo Michael castiga a bruxa, privando-a de usar magia em público e preconizando-lhe a perda dos poderes assim que ela deixar de ser virgem.

A partir destas premissas, o anime desenrola uma narrativa que mistura assuntos sérios, como a corrupção no clero, os traumas de guerra, teologia e caça às bruxas, com assuntos cómicos, como a ingenuidade de Maria, a rivalidade entre Artemis, Priapos e Ezekiel, e o facto de Maria, por ser virgem, não ter conseguido dar genitália masculina a Priapos.

Artemis e Priapos são família para Maria: foram transformados em succubus e incubus, respetivamente, por ela a partir de corujas, de forma a ajudá-la nas suas missões. Ezekiel é uma anjo enviada pelo Arcanjo Michael, que toma também a forma de uma pomba, com o objetivo de assegurar que a pequena bruxa não usa magia em público, mas Maria, Artemis e Priapos acabam sempre por lhe dar a volta. Joseph é um humilde servo, que acaba por se apaixonar por Maria e a apoia em quase tudo, sendo um forte aliado.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_03_pn

Ainda assim, Junketsu no Maria não é tão fácil de compreender; toda a envolvência medieval e religiosa que o anime contém poderia arruiná-lo, mas não é o caso. Não há necessidade de saber a fundo o que aconteceu entre França e Inglaterra pela Guerra dos Cem Anos, nem tão pouco é preciso ser-se devoto da Igreja Católica; o anime acaba por se moldar ao visualizador, sem que este se sinta perdido, incutindo-lhe a vontade de ler e descobrir mais sobre estes factos.

As personagens também vão dando dicas sobre algumas figuras históricas e algum contexto socio-religioso. Por exemplo, no primeiro episódio, Maria diz que a Igreja Católica está repleta de homens com medo das mulheres, e dá o exemplo de La Pucelle (Joana D’Arc), afirmando que esta, um dia, será canonizada e reconhecida pela Igreja. Com esta informação, o anime pode muito bem localizar-se entre 1431 (morte de Joana D’Arc) e 1453 (fim da Guerra dos Cem Anos), coincidindo com a Batalha de Formigny (1450) ou com a Batalha de Castillon (1453), ambas em solo francês. Junketsu no Maria consegue ter coerência histórica, apesar de a bruxa interromper todas as batalhas, impedindo a demonstração das vitórias factuais da França.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_04_pn

As batalhas por si só não são muito entusiasmantes. Todavia, sempre que somos levados a dar atenção a determinado(s) personagem(ns), a envolvência muda completamente e o visualizador sente vontade de torcer pela vitória. Tendo em conta o contexto histórico, não há propriamente armas de fogo, mas sim de madeira e ferro. Todos os episódios têm um momento chave de ação, mais ou menos intenso, que faz com que o visualizador não queira perder nenhum episódio.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_05_pn

Não existem personagens vazias nem sem propósito. Cada uma tem a sua razão de ser e para aparecer em certas alturas, com motivos credíveis que acrescentam emoção à narrativa. O credo também é testado, assim como os pontos de vista sobre diversos assuntos, trazendo diversidade de pensamentos e tornando o anime imparcial nalguns aspetos. Cada relacionamento tem uma base coesa e credível, que nos é sempre comprovada pela resolução dos problemas que a narrativa vai trazendo ao longo da história.

Junketsu no Maria não tem como temática a sexualidade; ainda assim esta acaba por ter certa relevância na história – Maria é virgem e, se perder a virgindade, perde também os seus poderes; Priapos é um incubus sem genitália; Artemis é uma sucubus sem qualquer pudor; existem relações homossexuais no clero. A história consegue manter um nível maduro de piadas sexuais, sem exagerar e com a sensatez de saber quando parar. Mesmo tendo em conta as indumentárias de Maria e Artemis, a história tem uma envolvência e seriedade tais, que esse assunto passa a ser secundário.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_06_pn

A animação fez-me recordar o estilo de desenho de alguns animes dos anos 90, como Robin Hood no Daibouken ou Cinderella Monogatari, mas com toque atual; não tem muito as típicas caretas e expressões exageradas dos animes dos anos 90, mas, a nível de linguagem linear, cromática e tratamento de luzes, consegue-se encontrar algumas semelhanças.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_07_pn

O elenco conta com Kanemoto Hisako (Ami em Sailor Moon Crystal, e Yayoi em Precure) como Maria, Ono Kensho (Saline em Aldnoah.Zero e Tetsuya em Kuroko no Basket) como Joseph, Hikasa Yoko (Rei em Free! e Mio em K-On!) como Artemis, Komatsu Mikako (Shuuko em Ao Haru Ride e Miuna em Nagi no Asukara) como Priapos, entre outros atores brilhantes.

Pequenos detalhes como menção a figuras históricas reais, o título dos episódios em latim, os nomes das personagens inspirados em figuras bíblicas ou o trocadilho intencional entre a Virgem Maria e a bruxa Maria que é virgem, têm uma importância enorme, pois todos eles constroem e sustentam firmemente este anime, sem esquecer todos os outros aspetos mais óbvios e que não passam despercebidos. Senti a falta da comunicação nas línguas originais (francês e inglês), mas, por outro lado, adorei as falas em latim, pelo menos da parte do clero. Tendo em conta que nessa altura o latim era utilizado no centro e no sul da Europa, dei-me por satisfeita.

junketsu_no_Maria_Virgin_Witch_ana_03_pn

A história do anime não é fiel à do manga, visto que saíram quase ao mesmo tempo. Existem rumores da possibilidade de uma segunda temporada, mas até lá, convido-vos a fazerem uma viagem no tempo, sentados numa vassoura mágica, rumo a um mundo melhor.

Positivo

  • Narrativa baseada em contexto histórico real
  • Cada personagem tem carácter forte, não sendo facilmente esquecida
  • Tanto teístas como ateístas conseguem desfrutar do anime
  • Comédia, drama e fantasia de mãos dadas
  • Inclui temas pouco tratados na indústria anime
  • Piadas sexuais q.b.
  • Interação fervorosa entre personagens

Negativo

  • Palavra “virgem” pode afugentar alguns visualizadores

 

pn-muito-bom-2016-3

Share

You may also like...

error

Sigam-nos para todas as novidades!

YouTube
Instagram